Simplicidade, praticidade, leveza. Produtos para a vida real.

Produtos para a vida real.

Compre aqui!

Um discurso que cansa a beleza

14/07/22

Cris Pàz é colunista do Dia de Beauté, onde publica mensalmente sobre beleza e longevidade.

Quando faço aquela limpa na geladeira, buscando alimentos que estão prestes a se perder, ou quando confiro na caixa de remédios os comprimidos cujos prazos de validade já expiraram, eu sempre me assusto com a velocidade do tempo. 

E é sobre uma data de validade vencida que a palavra menopausa sempre me acenou por anos. Era assim que minha mãe se referia a esse período quando dizia “Agora é esperar os netos chegarem”. Ela se foi muito cedo, só conheceu duas netas dentre os oito que teria no total, e perdeu as grandes revoluções promovidas pela nova longevidade. Se estivesse aqui hoje, teria 83 anos e descobriria que a menopausa está longe de ser o fim da linha. Em compensação, a escolha de como viver o processo pode ser uma estrada longa demais, pela qual a gente segue desconfortável e cheia de inseguranças. Eu achava que gestar e criar um bebê era a coisa mais complicada do mundo. Mas descobri que cuidar de mim na menopausa é um enigma. 

Que esse negócio de envelhecer toma o tempo da gente, eu não tinha dúvida. É preciso abrir espaço na agenda para a atividade física frequente, a escolha e o preparo criteriosos dos alimentos, a ingestão diária de vitaminas. Sem contar as consultas, em intervalos curtos, com profissionais de várias especialidades da saúde. Mas posso dizer seguramente que meu maior investimento tem sido na tentativa de decidir que caminho escolher para vivenciar minha menopausa. Comemoro, claro, o aumento das possibilidades: das poucas existentes no tempo da minha mãe, algumas se mostraram nocivas. O próprio câncer de mama que a vitimou pode ter alguma relação com a reposição hormonal. (Sim, a coisa era complexa desde sempre, mas me parece bem mais agora porque está a um palmo do meu nariz.)

Se ao menos existisse um manual com uma lista de melhores práticas, como já existiu um Manual do Bebê (o do Dr. Rinaldo de Lamare, aliás, se mostrou obsoleto em 2007, quando tive meu filho). A gente diz “menopausa” como se fosse um conceito só, mas, quando está a caminho dessa fase, descobre que ela pode ser muitas, como são diversos os processos de envelhecimento. 

O processo da menopausa é complexo. A gente não tem ideia de como acontece de fato. E quando busco informações, em lugar de esclarecida, me sinto angustiada.

Não se trata de uma estrada com uma bifurcação, mas sim de um labirinto cheio de possibilidades. E a maior delas é se perder no caminho.

O processo da menopausa é, em si, complexo. A gente não tem a menor ideia de como ele acontece de fato. E quando vou em busca de informações, em lugar de esclarecida, eu me sinto angustiada. E culpada também. Afinal, já tentei três caminhos de reposição hormonal e o caminho da não reposição, e só um sintoma persiste: a sensação de que não fiz a escolha certa. Lembrando que minha escolha de agora aos quase 52, terá impacto para o resto da minha vida, cuja duração pode ser outros 50 anos.

Uma pesquisa recente do Ibope aponta que as mulheres de 55 normalmente estão mais satisfeitas com a própria pele do que as mais jovens. Há quem aposte na hipótese de que, nessa fase, a mulher se observa mais, se cuida melhor e assim pode se sentir mais tranquila e satisfeita. Outro ingrediente desse resultado pode ser um tempo de “acomodação” à ideia do amadurecimento, com seus prós e contras. Mas eu aposto na tranquilidade reparadora que essas mulheres provavelmente já conquistaram: a de estar em paz com suas escolhas. Aconteceu com meu cabelo branco, com a maneira como encaro os procedimentos estéticos nessa idade. Mas ainda não conquistei essa paz no que diz respeito à minha menopausa.

Que envelhecer toma o tempo da gente, eu não tinha dúvida. Meu maior investimento tem sido em tentar decidir como vivenciar minha menopausa.

E como a palavra-chave costuma ser o equilíbrio, fico com a única matéria que conseguiu gerar em mim alguma serenidade, e que deixou uma frase provocativa na minha memória. “Imagine o lucro de quem vende um medicamento que metade da população deveria tomar.” O texto publicado no site da CNN Brasil conta de um grupo internacional de especialistas defendendo a normalização do envelhecimento e a celebração da força, beleza e conquistas das mulheres de meia-idade. E cita um artigo recente publicado no British Medical Journal, em que a obstetra Martha Hickey, do Royal Women’s Hospital, Austrália, e três professores em saúde da mulher (do Reino Unido, EUA e Austrália) discutem as atitudes sociais e culturais em relação à menopausa. As narrativas sobre a menopausa “oscilam entre o ‘tudo é natural’ e a completa patologização”, diz o artigo, que também revela que, entre 1960 e 1975, a terapia hormonal teve um grande boom depois que alguns endocrinologistas reprodutivos redefiniram a menopausa como uma ”doença por deficiência de estrogênio”. E, embora estudos mostrem a eficácia da TRH (Terapia de Reposição Hormonal) em ajudar essas mulheres que apresentam sintomas moderados a graves nessa fase da vida (16% a 40% delas, segundo estudo recente), os especialistas acreditam que “a ‘medicalização’ da menopausa pode aumentar a ansiedade e a apreensão das mulheres sobre esse estágio natural da vida”.

Eu me vi nessas aspas aí acima. Sinto como se não fazer uso da TRH fosse o mesmo que dizer que não estou tratando essa minha doença chamada menopausa. 

No fim das contas, a matéria alerta que a abordagem do tratamento da menopausa revela mais do que os caminhos da ciência e traz à tona um traço marcante da nossa cultura: uma clara associação entre a terapia de reposição hormonal e a expectativa de manter a juventude. 

Mulher não tem prazo de validade, diz a camiseta criada pela minha amiga Patrícia Parenza, numa retórica excelente para tirar esse estigma horroroso que paira sobre as mulheres na menopausa. Mas, não dá para negar, não somos eternas. O ser humano é perecível e é melhor lidar logo com esse conceito de vulnerabilidade. Em nome da nossa saúde mental.

Cris Pàz é colunista do Dia de Beauté, onde publica mensalmente sobre beleza e longevidade. Publicitária premiada e escritora com oito livros publicados, ela nasceu em 1970 e é uma das precursoras da produção de conteúdo digital no Brasil. Colunista da rádio BandNews FM de BH, comanda o podcast 50 Crises (entre os destaques de 2020 no Spotify Brasil) e traz novos olhares sobre saúde mental, protagonismo feminino, maternidade, moda e longevidade por meio de suas redes e palestras.

{Foto: Olia Gozha / Unsplash e reprodução Instagram @eucrisguerra}

Comentários

(Veja Todos os Comentarios)

7 replies on “Um discurso que cansa a beleza”

Comigo acontece o mesmo, tenho 52 anos, ingressei há 2 anos no climatério, não tenho nenhum sintoma específico desta fase, mas me sinto pressionada a ” me tratar” com TRH, como garantia de saúde.
Me identifiquei muito com a tua reflexão e penso que devemos falar mais, sobre isso.

Estou na menopausa há quase 10 anos e me preparei para recebê-la naturalmente. Não tenho quase nenhum sintoma e nunca fiz reposição hormonal. Envelhecer pra mim é o presente para quem vive muito, então está tudo bem. O segredo é treinar os olhos para enxergar a beleza de cada fase da vida e não misturar uma com a outra.

Prezada Cris, a menopausa é um baque gigantesco.
Não sou de muitas vaidades, logo, não me foco na manutenção da beleza. Mas me impactei demais pela perda muscular, perda da vitalidade e a sensação de fragilidade. Do nada, emagreci muito. Investiguei tudo, para chegar à conclusão que era ação da menopausa, 2 anos após a ultima menstruação. Perdi 8 cm de busto e agora, quando deito de costas ou de lado, não tenho mais nada dos seios fartos. Perdi o volume das nádegas. O cabelo virou uma coisa amorfa e seca e encaracolou, em um esvoaçante rebelde, que não tem nada a ver comigo. Sou a exata visão da bruxa da Rapunzel, do desenho “Enrolados”, da Disney, vai lá ver. Aliás, se aquela flor mágica do desenho existisse, seria um dos itens mais vendidos do mundo!!!!!
Optei por fazer a reposição hormonal e tive excelente resposta para minha insônia, calores, e sensação de fragilidade, além de começar a responder à perda óssea. Tenho 54 anos e fui agora a uma geriatra, ela já foi indicando o implante hormonal. Eu declinei, porque a sociedade de endocrinologia condena e até porque não a achei tão bem assim como modelo de usuária. Sinto a pressão, mas não quero ser jovem de novo, quero viver com saúde e bem. Minha amiga de mesma idade levou um tombo e se quebrou em três partes, com direito à cirurgia e cama por dois meses. Fiquei em choque com a perspectiva da perda óssea pela menopausa e o perigo de se tornar dependente fisicamente.
Nem vou falar da vida sexual, impactada pela flacidez vaginal. Tenho agora a necessidade absoluta de fazer exercícios de Kegel, o que faço religiosamente, para também evitar a incontinência urinária.
É muita mudança. É muita perda. A gente perde a si mesma e tem que se reinventar. Por mais bem humoradas que sejamos, é duro enfrentar a questão de se tornar invisível como mulher – nas palavras de uma antropóloga, de um texto lido na revista Claudia.
Também sou uma pesquisadora do assunto. Percebo em mim a mudança mental – não quero mais certos tipos de roupa, ao mesmo tempo que busco identificar o que me fica melhor. Percebo que queremos roupas com conforto, beleza e modernidade. Queremos conversas inteligentes e um olhar filosófico sobre a vida. E, se possível, o tal manual que detalhe tudo o que devemos fazer: a rotina de exercícios, a periodicidade de exames médicos necessários, a lista de suplementos, os tratamentos de pele que funcionam para todos os bolsos, as atividades mentais mais indicadas, a lista de lojas mais afins com nossa identidade de vestuário… Enfim, uma confraria que seja objetiva e prática, porque não temos nenhum tempo a perder (e sem propagandas, que ninguém merece).
Que tal vc criar esse canal para nós?

Adorei! Ainda não enfrento essa fase mas cada vez mais penso sobre o assunto e sinto como é complexo para a mulher! Espero que a gente encontre nosso caminho para esta fase!

Não vejo a reposição hormonal como uma tentativa de manter a juventude. Para mim, 54 anos e 4 de anos de reposição hormonal, além de ser “una enchada de bolas” como dizem na Aregntina, meu lar atual, é uma opção por mias qualidade de vida. Nada de insônias, nada de calores, nada de falta de energia. Adoraria me ver livre das pílulas de reposição, mas por ese momento, não vejo outra opção. Se alguém tem um depoimento diferente, o que não é o caso das minhas amigas na mesma fase, adoraria ouvir…
Beijos
Lee

Adorei muito. Precisamos falar mais sobre climatério e menopausa e o DDB com Cris paz arrasou!

Leave a Reply

Your email address will not be published.

Categorias:
Tags: