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Anos perfeitos são os que nunca chegam

19/12/23

Não vai dar tempo, nunca será como você sonha, e saber disso talvez seja a chave para finalmente ser bom.

Anos perfeitos são os que nunca chegam

Nos meus vinte anos, a maquiagem quase não fazia parte do meu cotidiano. Para aquela pele praticamente sem rugas ou manchas, batom e lápis de olho eram meu kit de beleza. A máscara de cílios entrava na jogada em dias de festa e olhe lá. As olheiras que nasceram comigo, aprendi a aceitar como parte de mim. Adorava ser mortal no dia a dia e me realizar com o poder transformador de uma eventual e bela maquiagem.

Eu não usava maquiagem nem mesmo quando comecei meu blog de moda, o pioneiro em looks do dia no Brasil, que criei aos 37 anos. Só despertei para o poder de uma pele bem-feita quando estava prestes a chegar aos 40. Confesso que foi boa essa descoberta tardia: aos 53, me esbaldo numa Vic Beauté como criança em parque de diversões. Ao longo desse tempo, aprendi a fazer do recurso um jogo divertido em torno da ideia da perfeição: um passeio rápido pela utopia com passagem de volta incluída — da fantasia à vida real sem maiores sobressaltos. Assim permaneço em paz com minha humanidade, que a cada dia se sente mais em casa.

Hoje, sei me maquiar e até brinco com um outro tom de sombra. Me orgulho de ouvir perguntas do tipo “Quem fez sua maquiagem?” e logo dou os créditos à Petty, amiga visagista e maquiadora, que me ensinou passos simples, especificamente para o desenho do meu rosto. A técnica funciona no dia a dia e até em viagens, eventos e sessões de fotos. Corretivo, contorno e iluminador fazem parte do meu kit, agora mais completo, e me deixam à vontade nos vídeos.

Compreendi que, como a roupa, na medida certa a maquiagem é uma grande aliada para um envelhecimento ensolarado e de bem com a vida. É claro que não resisto à cadeira de um make up artist, como também não rejeito os cuidados de uma boa massagem. Mas me nego a me tornar refém dos produtos de beleza, como confessou recentemente a Sandy. Usá-los a meu favor me dá a sensação de um certo poder sobre minha imagem, mas conhecer os meus limites é parte fundamental nesse “livre arbítrio”. Saber que posso transitar entre a feia e a bonita, a vida real e o glamour torna mais divertida a minha experiência por aqui.

A despeito dessa introdução empolgadíssima, sinto dizer que este não é um texto sobre maquiagem – nesse site literalmente lindo, tem gente muito mais competente para aprofundar no tema. O foco aqui é o que esse hábito acabou me ensinando sobre outros setores da vida.

Investir um tempo para ficar “bonita na foto” é também um jeito de embelezar o mundo, quase um gesto de gentileza urbana. Maquiar-se não deixa de ser um ritual, um pintar a pele que celebra ocasiões importantes, sejam elas frequentes ou raras. E falar sobre rituais, em pleno fim de ano, me remete aos que fazemos nessa época e que dizem muito sobre nós.

A vida deixada para o futuro é um jeito charmoso de não chegar, não se comprometer, não viver

A palavra padrão desconhece o possível. Fomos ensinadas a nunca ser suficientes. Nunca estaremos prontas, plenas, perfeitas. Porque é essa ideia de perfeição como algo único e inigualável — portanto inatingível — que se encarrega de estragar tudo. Essa ilusão de que um dia chegaremos no ponto, no auge, no sucesso, na proporção, no formato. Enquanto não percebemos essa cilada, passamos boa parte da vida vivendo pela metade.

Sim, as promessas de fim de ano estão nesse pacote. E todo ano é a mesma coisa: você passa os últimos dias planejando o que mudar no ano que vem, abreviando esses dias em nome de outros melhores que ainda estão por vir. “No ano que vem vou à academia todos os dias — por isso hoje não vou.” “Ano que vem vou comer melhor, por isso vou devorar essa torta agora”. É no ano que ainda não chegou que você vai meditar, beber menos, se organizar, ter mais tempo, mais dinheiro. É no porvir que você vai cumprir suas promessas, ser feliz porque agora não dá. No ano que vem, quem sabe, você vai mentir menos para si mesma. O que você queria para um ano, deixa para o próximo. E assim sucessivamente. Essa vida deixada para o futuro é um jeito charmoso de não chegar, não se comprometer, não viver. E dizer sempre que dessa vez não deu, mas, na próxima, com certeza. De tanto desejar, sobra pouco tempo para fazer.

Colocar o foco no que virá nos leva a desprezar o que estamos vivendo. Em lugar de almejar o ano perfeito, buscar o brilho do que está em curso é o pulo do gato para brincar mais com essa vida transitória e (porque é vida, e não filme) imperfeita. Saber encontrar no momento presente os pontos de luz, o delineado matador, o brilho que surpreende, é o que fará a nossa presença no tempo ser boa e única. Vivenciar a imperfeição com tranquilidade e não levar o perfeito a sério é um jeito de olhar no olho da vida e enfim compreender que ela acontece no gerúndio, não no futuro.

Anos perfeitos são os que nunca chegam. Ou aqueles que já passaram — não se esqueça que a memória é romancista nata. Preparar-se para a chegada do ano não é parar a vida. Pode ser viver o que se está vivendo nesse instante. Parar de condicionar a alegria à realização das coisas como as almejamos e colocar, ao contrário, as concretudes como fruto das alegrias. Fazer as pazes com o erro, o quase, o não feito e não alcançado. Celebrar ciclos que terminaram, porque são eles que abrem as portas para os que virão. Encontrar serenidade na impermanência e abraçar a imperfeição como a companhia mais divertida, aquela que nos faz chorar de rir até borrar a maquiagem. É disso que fala esse texto.

Que tal trocar as promessas para o próximo ano por momentos preciosos no ano que ainda não acabou? Ou eleger um único objetivo como norteador do ano que virá? Promessa de ano novo: fazer as pazes com a imperfeição. Abraçar sua humanidade e aprender a fazer escolhas. Não vai dar tempo de fazer tudo, é impossível colocar todos os planos em prática — e está tudo bem. Que no novo ano, ou melhor, agora mesmo, a gente aprenda a ser de verdade para não morrer de ficção.

Cris Pàz é colunista do Dia de Beauté, onde publica mensalmente sobre beleza e longevidade. Publicitária premiada e escritora com oito livros publicados, ela nasceu em 1970 e é uma das precursoras da produção de conteúdo digital no Brasil. Colunista da rádio BandNews FM de BH, comanda o podcast 50 Crises (entre os destaques de 2020 no Spotify Brasil) e traz novos olhares sobre saúde mental, protagonismo feminino, maternidade, moda e longevidade por meio de suas redes e palestras.

{Fotos: reprodução Instagram @eucrisguerra / Foto @estaticozero e Pegah Sharifi / Pexels}

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