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Parar é revolucionário: sobre a falta que não fiz e o que posso aprender com ela

21/11/23

Cris Pàz é colunista do Dia de Beauté, onde publica mensalmente sobre beleza e longevidade.

Pode ser que você tenha sentido a minha falta. A frase está mais para um desejo do que para uma previsão. Aposto que você nem notou a minha ausência. Provavelmente, entretida com tantos outros conteúdos, você nem percebeu que deixei de publicar minha coluna por aqui no mês passado. Fato é que eu precisei parar por uns dias, o que para mim foi um desafio. Fiz um repouso de 15 dias para uma cirurgia planejada desde junho, de caráter preventivo, mas não sem uma dor no coração e outra dor maior na consciência. 

É, nos acostumamos a ser medidas por nossas agendas lotadas e nossa produtividade. Sumir por alguns dias (um mês, vá lá) traz uma estranha sensação de fracasso, embora, na prática, poder se dar a esse luxo é que seja de fato uma prova de sucesso. Parei por falta de opção, não por escolha. 

Embora confesse que, deixando de lado o medo da cirurgia, me vi ansiosa por esse momento de descanso. A parte mais difícil foi ter de dizer não a alguns trabalhos, compreender que minha saúde precisa ser prioridade. E embora tenha sido a retirada do meu útero quem tratou de parir uma pausa, eu tive tempo para sentir culpa. Durante o repouso, fiquei estéril de novidades, temas, opiniões. Só queria parar um pouco, cuidar de mim e não pensar em nada. E ainda que estivesse no meu direito, eu não me senti no direito. 

Mesmo tendo uma orientação médica como álibi, a sensação era a de estar fazendo uma espécie de greve comigo mesma. Acordava tarde, postava memes, brincava de esconde-esconde com o algoritmo. De 100 a zero em 10 segundos de anestesia. A revolução do desacelerar. Nos primeiros dias foi estranho. Nos dias seguintes, passei a lutar contra o tédio, uma sensação de estar fora do mundo. Ouvia as vozes da minha mãe e da minha avó repetindo os méritos de nunca estar “à toa”. 

Parar foi uma ousadia e uma descoberta. Esperar o tempo da natureza, que não obedece à cabeça.

Não aprendi a me permitir pausas. Enquanto eu me recuperava, a vida e as redes sociais seguiam a pleno vapor. Os algoritmos passaram a me olhar torto, punindo-me com mais invisibilidade. Na consulta de retorno, o médico me contou que a cicatrização completa demanda 6 meses. A atividade física precisa ser retomada devagar, de forma gradativa. Justo agora, que eu estava adaptada e até sinto falta da academia. O tempo do corpo, o tempo da vida. 

Parar foi uma ousadia e uma descoberta. Observei as postagens, notícias e novidades sem fim. Foi difícil assistir ao jogo da arquibancada, sem emitir opiniões ou trazer novidades, sem exibir conquistas ou pioneirismos. Esperar o tempo da natureza, que não obedece à cabeça. Parar foi um aprendizado. Parar para descansar, para não fazer nada, parar para parar. Pensar, observar, entender o que meu corpo diz. Parar para me ouvir e lembrar de mim. Parar é revolucionário — mais do que isso, revelador. 

Num desses dias de tédio, encontrei escritos antigos, de quando meu filho ainda era pequeno: “Às vezes, o que me falta é descanso. O que me escapa é a pausa. Como se em uma distração a vida pudesse fugir. Minha respiração é curta como é rápido o meu pulso. Sempre alerta. A postos para não parar. Ainda mais com uma vida outra batendo fora de mim, um amor de pernas e braços que caminha sem fim pra ganhar o mundo. Tenho fobia do não fazer. E penso tanto, que nem cabe na fala. As 24 horas do dia, dou um jeito de transformar em 30, nem que seja no silêncio da madrugada. A vida sempre me diz “não tente me controlar”, mas eu finjo que não entendo. O que ela quer de mim é coragem, já disse o João. E eu faço de conta que sou corajosa. Mas faço tão bonito, que ela até acredita.”

Faz tanto tempo que eu queria fazer uma pausa — pausa mesmo, não férias. Meu corpo teve que pedir por mim, ensinar-me que parar também faz parte do movimento. Deparei com minha desimportância e fiz as pazes com ela. Entendi que o mundo pode continuar sem mim. Eu não. Eu preciso de mim para continuar. 

Cris Pàz é colunista do Dia de Beauté, onde publica mensalmente sobre beleza e longevidade. Publicitária premiada e escritora com oito livros publicados, ela nasceu em 1970 e é uma das precursoras da produção de conteúdo digital no Brasil. Colunista da rádio BandNews FM de BH, comanda o podcast 50 Crises (entre os destaques de 2020 no Spotify Brasil) e traz novos olhares sobre saúde mental, protagonismo feminino, maternidade, moda e longevidade por meio de suas redes e palestras.

{Fotos: cottonbro studio e Madison Inouye / Pexels}

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