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Um ano sem Glória Maria: ícone de beleza e revolução

02/02/24

Glória Maria era leonina, nascida no dia 15 de agosto, e como ela não gostava de revelar a idade, também irei omitir. Era intensa, inteligente, comunicativa, pensava rápido e amava seus cabelos. Não à toa, nutriu uma bela amizade com seu cabeleireiro, Tiago Parente, com quem eu conversei para escrever essa matéria sobre a relação da saudosa jornalista com a beleza.

Glória Maria e Ti Parente

Considerada a primeira repórter negra de TV no país e pioneira em uma transmissão ao vivo e a cores em 1977, Glória frequentava um salão em Ipanema, quando conheceu Tiago, onde o cabeleireiro estava no lugar certo e na hora certa. 

“A conheci em 2001, quando abri o meu primeiro estúdio, mas a Glória cortava o cabelo com um amigo meu no andar de cima. Ele me apresentou ela e foi assim, amor à primeira vista. Sempre que ela ia lá, ele já tinha atrasado umas 4 clientes, então ela vinha para o meu estúdio e ficava lá conversando comigo, tratava o cabelo, fazia lavagem, secagem, manicure e tal. Aí, um dia, ela falou assim ‘corta você o meu cabelo, você quer cortar? Porque não aguento mais essa coisa de atraso’. Glória era uma pessoa muito ligada no 220V, muito ansiosa, muito rápida, gostava de tudo para ontem, sabe? Claro que eu aceitei e fui o cabeleireiro que cuidou dela desde então. Sorte minha que o meu amigo tinha esse problema com a agenda, né?”, brinca.

Sem nenhum cabelo branco 

Glória experimentou vários estilos de cabelos ao longo da vida e carreira. Quando começou a trabalhar na Globo em 1970, usava o cabelo crespo.

“Ela não tinha nenhum problema com o cabelo dela natural e, por incrível que pareça, não tinha um fio branco. Tinha puxado a mãe dela, que faleceu velhinha, também sem cabelo branco. Então, ela dizia que o fato de não ter que pintar o cabelo era maravilhoso, e que era um caso a ser estudado pela NASA. Glória adorava o próprio cabelo. Tanto que usou ele crespo por um bom tempo”, afirma.

Foi só em 1998, quando começou a apresentar o Fantástico, que começou a alisar os fios. “Glória alisava e usava ele preto e redondinho, aí quando comecei a cortar, fui adicionando movimento, ondulações e também começamos a clarear. Ela sempre dizia que o seu corte preferido era o último que eu tinha feito. Então, se deixava a nuca de fora, ela amava, falava que aquilo ali era o cabelo mais lindo da vida dela. Se eu a deixasse um pouco maior, ela também o amava. Eu só não podia deixá-lo muito claro, pois assim ela não gostava. Ela era a personificação da leonina, gostava de estar com o cabelo sempre impecável”, relembra Tiago.

20 horas para aplicar extensão nos cabelos

A jornalista usava extensões de megahair, porque gostava de dar movimento ao cabelo. “Ela achava que lhe dava sensualidade, o balanço. “A colocadora do mega ficava dois dias na casa dela fazendo as trancinhas, era tipo 20 horas para aplicar a extensão, de tamanho cuidado e perfeição. O alisamento era para baixar a raiz e encaixá-la com o outro cabelo. Feito isso, eu cortava e fazia a coloração, mechas de balaiagem bem fininhas na cor mel, e hidratações de vez em quando – mas ela não tinha muita paciência para ficar muito tempo hidratando, não”, afirma o cabeleireiro. 

Tiago relembra que Glória aparecia no salão uma vez por semana ou no máximo de 15 em 15 dias para acertar o corte. “Ela passava na porta, entrava e falava ‘amore, olha o meu cabelo, como é que tá?’ Eu dizia, tá, depois dessa cliente aqui, eu vou te olhar, entre uma e outra, espere um pouquinho. Então ela ficava na porta, já ansiosa, olhando seus dois celulares sem parar. Aí eu tinha que dar umas três ou quatro repicadas, mexer um pouquinho, sabe? E ela amava aquilo, se sentia renovada, deixava ela muito feliz”.

“O meu segredo é não passar nada” 

Quando o assunto era maquiagem, ele conta que no dia a dia Glória não gostava de usar nenhum produto de correção. “Ela usava somente um tônico da Adcos depois de lavar o rosto. Dizia: ‘o meu segredo é não passar nada, não gosto de cara verde’, remetendo à dificuldade de encontrar produtos que ficassem bem na pele negra. E era assim, senhora de si, não estava nem aí”, conta o amigo. 

A beleza da pele jornalista era motivo de questionamentos, tanto que ela chegou a revelar em entrevistas que usava uma “receita secreta”, indicação do cirurgião plástico Ivo Pitanguy, que era um mistura de Bepantol, Hipoglós e algumas gotinhas das vitaminas E e A.

“Ela tinha um closet enorme, que dá umas três voltas”

Glória gostava de se vestir bem e por isso criou um acervo enorme de peças ao longo da vida. “Ela era muito vaidosa também com moda, gostava de comprar roupas e se vestir bem. Tinha um closet enorme, que fazia três voltas, e ainda assim sabia exatamente onde estava cada peça – isso me impressionava muito. Tinha também um quarto cheio de araras com roupas típicas africanas – como o dashiki, uma vestimenta colorida, parecida com uma bata longa. Ela viajava o mundo e comprava essas peças”, diz.

Referência negra no jornalismo 

Glória Maria abriu portas para muitos profissionais negros e também foi a primeira brasileira a usar a Lei Afonso Arinos contra o racismo. Luanda Vieira, jornalista de moda e beleza, conta com carinho que ela foi sua maior referência de como se comportar sendo negra no mercado de trabalho.

“Uma de suas falas resume parte das coisas mais valiosas que aprendi à distância, observando-a: quando perguntada se ela se sentia cobrada a se posicionar em relação a questões raciais, ela disse que ‘só de ser quem eu sou, não tem posicionamento maior do que esse. Eu fui a primeira e única nesse País a usar uma lei que existia contra o racismo. Então a gente tem que aprender a usar a nossa alma, a nossa inteligência, a nossa cultura para tentar acabar com ele da maneira que cada um de nós conseguir e puder. O que é se posicionar contra o racismo? Sair numa passeata, numa manifestação? Me poupe, né?’. Glória me ensinou que o meu corpo é político, mesmo calada; e que ser excepcional é o maior posicionamento que se pode ter sendo mulher negra”, conclui Luanda. 

Glória foi uma mulher excepcional.

{Fotos: reprodução @tiparente e @gloriamariareal}

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