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Uma pergunta (ou muitas) chamada menopausa

17/10/24
Uma pergunta (ou muitas) chamada menopausa

Quando eu me dei conta de que estava envelhecendo — essa palavra que aprendemos a ver como mal-assombrada —, eu juro que nem pensei sobre a menopausa. Naquele momento ela era um detalhe pequeno demais. Apenas o fim do ciclo menstrual e ponto. Talvez até o lado positivo. 

“Isso não vai acontecer com você”, disse Rodrigo Hilbert para Fernanda Lima, como ela mesma revelou no seu novo podcast, Zen Vergonha, cuja primeira temporada é inteiramente dedicada à menopausa. Quando o sinônimo da perfeição feminina se viu diante dos sintomas do climatério, o marido (que habita os sonhos de todas) entrou em negação. Como assim, a Fernanda Lima na menopausa? Isso é só para as mortais. 

Mas um dia eu comecei a falar sobre o envelhecimento. A despeito do meu vício em ser caçula, eu já não era a mais nova das rodas que frequentava, mesmo com o espírito moleque que insiste em me habitar. Falar sobre a passagem do tempo me trouxe descobertas que, confesso: admirei feito criança. A primeira delas? Foi com o cabelo branco que eu finalmente me senti adulta, mulher feita, depois de uma vida ocupando um lugar infantil. A mais nova dos irmãos é aquela que parece nunca amadurecer e, de repente, eu estava na menopausa, proporcionalmente antes das minhas irmãs mais velhas. Depois de alguns exames e de não me adaptar à terapia de reposição hormonal, diante de um diagnóstico de osteoporose, a minha médica sugeriu a histerectomia. Tirar o útero? Ainda não, cravei a resposta. “Isso não vai acontecer com você”, citei Rodrigo Hilbert.

A menopausa é ritual de passagem, mas também é luto, é novidade mas também é despedida.

Isso foi anos depois de ter deparado com uma pergunta sobre o ciclo vital no dever de casa do meu filho, ainda pequeno. Eu, que raramente o ajudei em suas lições, topei justo com essa. “Essa eu sei”, ele se adiantou. E o “nasce, cresce, reproduz, envelhece e morre”  foi declamado com muito orgulho pela minha criança, dando como certo que a minha infância, essa sim, já era um passado muito distante. Eu deveria ter corrigido o aluno e, quem sabe, a professora: “Nasce, cresce, reproduz (ou não)  e esse ‘envelhece’ aí corre bem mais devagar. Não corre, anda. Nem sempre anda, às vezes se arrasta. É um tempo que nos obriga a parar, que nos obriga a pensar. E, de repente, nos vemos em pânico, porque as células se apressam, mas o pensamento, não. Procrastina, se detém na internalização daquela notícia de que o tempo não é mais o mesmo, está se esgotando. Um tempo de ampulheta, mas com muita areia, uma areia que não para de escoar, são toneladas. Toneladas de consciência que rebobinam a fita da minha vida, ao mesmo tempo em que me perguntam se eu ingeri a porção certa de proteína. Se dormi bem as horas recomendadas, se levantei peso suficiente, se o coração dá conta. A menopausa é uma conversa de homem pra homem com a mulher que fomos e pretendemos ser. Um telegrama sobre a morte, como a conversa que um dia meu pai teve comigo, sobre a brevidade da vida da minha mãe. É a hora do vamos ver se você sabe cuidar de si mesma, se enfim compreendeu que precisa ser sua prioridade, se o cuidado que sempre se voltou para o filho, o outro, a casa, o amor, o altar, a dor, se esse cuidado é pra você também. Mas não, “isso não vai acontecer com você”, já está acontecendo. É ritual de passagem, mas também é luto, é novidade mas também é despedida. Porque isso não vai acontecer com você: já não é mais você. É a vida e é outra você. 

Quem sabe esse despertar no meio da noite não é a metáfora certa para a menopausa? Um despertar, quando o resto do mundo permanece adormecido.

É um ciclo menstrual que te dá um tempo, é um tempo que a vida te dá, é uma vida que o tempo te tira, é uma vida que o tempo te dá, é um tempo que a vida te dá, é um espelho que o tempo te mostra, é você que o espelho te mostra, é a vida que você se deu, é a chance que você se dá, é você que agora tem chance, é o relógio correndo sem pausa, é a pausa que para pra ver, é o “corre” que para no espelho, é você que então para pra ver, é parar sem parar de correr, é o tempo se jogando em você, é você de presente pro tempo, é o tempo amando você, é você se amando no tempo, é pergunta do tempo pra si, é o tempo que faz a pergunta. É você que não sabe a resposta. É então que você se pergunta. É você e o tempo que para. É você, ou o tempo que para? É parar pra voltar a correr. É você. É o tempo e você. Sim, está acontecendo comigo, vai acontecer com você. Será que ainda é tempo? É conversa com a morte, é conversa com a vida. É você, parindo você. 

Isso tudo, escrevi de madrugada, quando aquele despertar das 2 ou 3 da manhã virou insônia, separando o sono em dois ciclos provavelmente insuficientes. Quem sabe esse despertar no meio da noite não é a metáfora certa para a menopausa? Um despertar, quando o resto do mundo permanece adormecido. Que te obriga a pensar na vida. Aquela pergunta que você se recusou a responder: o que você fez dessa vida que ainda está viva? O que você vai fazer, menina?

Menina. 

Cris Pàz é colunista do Dia de Beauté, onde publica mensalmente sobre beleza e longevidade. Publicitária premiada e escritora com oito livros publicados, ela nasceu em 1970 e é uma das precursoras da produção de conteúdo digital no Brasil. Colunista da rádio BandNews FM de BH, comanda o podcast 50 Crises (entre os destaques de 2020 no Spotify Brasil) e traz novos olhares sobre saúde mental, protagonismo feminino, maternidade, moda e longevidade por meio de suas redes e palestras.

{Fotos: Ron Lach e Pixabay / Pexels}

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