Um lembrete em vermelho: o poder transformador do batom vermelho
Não sou uma grande adepta do batom vermelho. No dia a dia, prefiro o cor de boca. E até quando capricho na maquiagem, costumo aderir ao “olho tudo, boca nada”. Meus traços já não são discretos e minhas tatuagens, menos ainda. Deixar o batom em segundo plano jamais vai me tornar transparente. Meus olhos se habituaram a chegar antes, e isso já virou uma espécie de marca registrada.
O que não significa que eu não tenha um ou mais vermelhos no meu kit de maquiagem. O recurso tem o seu lugar. Gosto de passear por diversos tons e, nas raras vezes em que decido lançar mão do vermelho, saio do básico e compro o pacote inteiro. Coloco um vestido poderoso, arrumo o cabelo de um jeito diferente, escolho um brincão e saio por aí, como se nem eu mesma me conhecesse. Costuma ser divertido, justamente por ser raro.
Sim, em alguns momentos, a vida pede um batom vermelho.
Equivalente ao poder do salto agulha, mas menos perigoso para quem, como eu, tem um diagnóstico de início de osteoporose, o batom vermelho é tiro e queda. Você passa e o mundo muda de cor. O espelho conta novidades sobre você. Os obstáculos se escondem — de medo. Você se sente pronta e capaz do que nem supõe. A vida se torna a própria urgência, parece que nada mais importa.
Uma boca pintada de vermelho nos rouba da rotina. Mesmo calada, tem muito a dizer. Você pode estar em casa, que vira festa. Pode nem haver motivo, mas se comemora. O trivial ganha importância e o que sequer era ocasião, recebe o status de especial. Hipnotizado, o mundo é capaz de ouvir as piores notícias vindas de lindos lábios vermelhos.
Mesmo que você ignore todas as histórias que estão por trás dele. Não é preciso ser letrado em cleópatras ou mesopotâmias, guerras ou revoluções. O batom vermelho diz tudo, em uma língua desconhecida. E se faz entender.
O batom vermelho é um lembrete de sonhar e transformar o cotidiano em celebração
O vermelho veste a boca de festa, põe moldura no sorriso, mete um sábado no meio da semana. Convida para um drink. Inventa o improviso que faltava. Tira da manga a frase de efeito, a piada pra quebrar o gelo.
É como aquela amiga que já te conhece de outros carnavais. Não importa a circunstância, ela sempre está lá. E mesmo que vocês se encontrem pouco, o resultado é sempre surpreendente.
Dias difíceis não resistem a um batom vermelho. Quando a vida pede uma virada, uma reinvenção, uma notícia boa. Uma postagem franca e fora do script. O batom vermelho é como um encontro com alguém que você não vê há muito tempo. Traz esperança e coragem.
Quando você acorda num dia em que a vida parece ter perdido a cor, lembrando uma foto esmaecida. Quando o cansaço e o tempo (ou a falta dele) nos dão aquele tapa de sépia, e nos desidratam os desejos. Você passa um batom vermelho e sai por aí.
O vermelho é um lembrete de sonhar.
Cris Pàz é colunista do Dia de Beauté, onde publica mensalmente sobre beleza e longevidade. Publicitária premiada e escritora com oito livros publicados, ela nasceu em 1970 e é uma das precursoras da produção de conteúdo digital no Brasil. Colunista da rádio BandNews FM de BH, comanda o podcast 50 Crises (entre os destaques de 2020 no Spotify Brasil) e traz novos olhares sobre saúde mental, protagonismo feminino, maternidade, moda e longevidade por meio de suas redes e palestras.
{Fotos: Cássia Paes}
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