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A beleza da mudança

15/03/22

Cris Pàz é colunista do Dia de Beauté, onde publica mensalmente sobre beleza e longevidade.

No último mês, fotos da cantora Beyoncé para uma campanha de sua marca geraram comentários indigestos. “É só mais uma celebridade de meia idade tentando aproveitar o fim da sua juventude”, dizia um deles. Repare como a passagem do tempo é citada como um fracasso. Como se envelhecer apagasse o talento de Beyoncé e, pior, como se não fosse o curso natural das coisas — inclusive para quem comenta.

Beyoncé já aprendeu faz tempo. Sabe que não é produto ou serviço para receber reclamação. E não vive pra fazer os outros se sentirem bem a seu respeito. Feio é quem ainda não entendeu isso.

Os termos gorda e velha, recorrentes nos comentários e ali colocados como ofensas, são palavras que não deveriam carregar juízo de valor. Funcionam em um contexto de comparação, e aí mora o problema. Numa sociedade machista e constituída pela competição, nunca somos bonitas ou magras, ou jovens o bastante. Sorte de quem percebe essa armadilha a tempo e investe numa transformação interna, antes de sair prestando contas para o mundo. 

Foi o meu caso — mas não sem sofrimento. Se na adolescência eu rezava para enfim ter “curvas femininas”, aprendi que meu corpo era diferente e botei as pernas finas pra jogo. O tempo que levei para gostar de ser magrela foi o mesmo que me fez deixar de ser. Paciência, eu já estava apaixonada por mim. Era cansativo demais invejar as colegas com o famoso corpo violão. 

Pois o tal “corpo violão” do imaginário brasileiro corresponde a, pasme, 5% das mulheres do país. Foi o que concluiu um levantamento da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que escaneou os corpos de 6400 mulheres ao longo de cinco anos. O resultado mostra que o biótipo da maior parte das brasileiras (76% delas) é retangular como o meu, aquele com a mínima diferença entre tórax e quadril, e cintura pouco marcada. Em outras palavras, passamos décadas cultuando uma mentira.

O tal padrão é pensado para ser acessível a poucos. Quanto mais raro, mais bonito. Mas perseguido pela maioria, uma fila de pessoas tentando ser iguais e evitando ser elas mesmas. Pode ser que sua história seja o oposto da minha — você passou anos sonhando em ser magra. Para mais ou para menos, muitas de nós vivemos insatisfeitas, inadequadas e pautadas pela opinião alheia. 

Minha beleza é praticamente uma decisão. Aos 19, eu me cansei do barulho do secador que disfarçava meu cabelo cheio e ondulado. Aderi ao curtinho e nunca mais deixei crescer. Fiz da diferença o meu traço. Depois que me entendi com o espelho, o resto perdeu a importância. E se alguém me chama de feia, faço como a Beyoncé: não acredito. 

Existe uma inteligência capaz de nos ajudar a descobrir uma beleza só nossa. Recursos estéticos também colaboram, claro. Mas nenhum deles funciona se não mudamos nossa visão sobre nós mesmas. A verdadeira revolução vem de dentro. 

Cheguei aos 51 confortável em mim como nunca. Aos 49 me perguntei: se esse cabelo já teve tantas cores, por que não me aventurar pelo grisalho? Enquanto a raiz crescia eu aguardava ansiosa, louca pra conhecer a nova velha eu. Entrei no salão com o cabelo preto e saí meio grisalha, meio careca. Nasci de novo, trinta anos depois do corte radical.

Cansamos de ouvir que não deveríamos ser como somos, buscando mudanças que nunca nos deixam satisfeitas.

Crescemos acreditando ter vocação para o desconforto. Habituadas a não nos aceitar, a não caber na roupa, quando é ela que tem de caber na gente. Engolimos desejos que não são nossos. Cansamos de ouvir que não deveríamos ser como somos, buscando mudanças que nunca nos deixam satisfeitas — nem a nós mesmas, nem aos críticos. E agora nos torturamos com as transformações naturais do envelhecimento? 

Viver é movimento. Um bebê se transforma em proporções impressionantes nos primeiros anos de vida. A adolescência faz uma revolução no cérebro e no corpo. Na fase adulta, as transformações se tornam mais lentas, voltando a se acelerar na idade que chamamos de envelhecimento — essa outra ilusão que um dia alguém inventou, como se não estivéssemos envelhecendo antes. Não há um segundo em que não estamos nos transformando. 

“Para ficar bonita a mulher tem que sofrer”, brincava minha mãe, para justificar o salto alto torturando os pés a festa inteira. Duvido que ela mesma acreditasse nesse absurdo. Beirando os 50 ela adotou as sapatilhas e deixou grisalho o cabelo que ela amava usar bem curto, ignorando críticas de quem quer que fosse. Ela sabia que bonito mesmo é ser feliz.

Tenho para mim que a beleza é um estado de espírito, um encontro entre quem é visto e o olhar de quem vê. Amadurecer é aprimorar a capacidade de enxergar o belo na alma das coisas. Quem se apoia na beleza plástica está apostando em um valor circunstancial. A chegada dos 50 pode ser um agravamento dessa não aceitação ou pode ser uma oportunidade: a de se libertar de uma vez por todas e tomar outro caminho. 

Amadurecer é aprimorar a capacidade de enxergar o belo na alma das coisas.

Quanto ao meu cabelo branco, fico feliz por ele fazer parte de um movimento que desmistifica a passagem do tempo, mas não foi isso que motivou minha decisão. E eu não o usaria se não me sentisse bonita assim. Não faz sentido quebrar um padrão para impor outro. E se a qualquer momento eu decidir voltar para a tintura, será reafirmar o que acredito: cada um escolhe o seu jeito de vivenciar a passagem do tempo, em qualquer momento da vida — conhece algum em que ele não esteja passando?

Acredito que combater o preconceito etário passa menos por palavras de ordem e mais por imagens apaixonantes. De mulheres incríveis, de todas as cores, etnias e biótipos, absolutamente lindas na fase mais madura de suas vidas — não por acaso, a mesma em que estão mais interessantes e no auge de suas atividades cerebrais. Estamos criando uma estética do envelhecimento, que desfila a beleza das fases da vida e mostra como é bonito se transformar.

Existe beleza na mudança. E uma imagem linda de uma mulher acima dos 50 está dizendo, sem palavra alguma, que não é hora de brigar com o tempo. É hora de fazer as pazes com ele.

Cris Pàz é colunista do Dia de Beauté, onde publica mensalmente sobre beleza e longevidade. Publicitária premiada e escritora com oito livros publicados, ela nasceu em 1970 e é uma das precursoras da produção de conteúdo digital no Brasil. Colunista da rádio BandNews FM de BH, comanda o podcast 50 Crises (entre os destaques de 2020 no Spotify Brasil) e traz novos olhares sobre saúde mental, protagonismo feminino, maternidade, moda e longevidade por meio de suas redes e palestras.

{Fotos: reprodução Polina Kovaleva/ Pexels, Márcia Charnizon e instagram @weareivypark}

Comentários

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6 replies on “A beleza da mudança”

Que texto brilhante! Cris, vc é só sensacional. Uma lição que pretendo aprender e exercitar sempre. Parabéns!

Que texto incrível. Me identifiquei com cada palavra e abri os olhos pra muitas coisas, um novo jeito de pensar daqui pra frente, sem tanta ditadura da beleza.
No auge dos meus 30 anos, esse texto foi pra mim, como um abraço de longe, deixando o coração quentinho.

Adorei tudo que li, é inspirador, por isso acho importante deixar um relato. Sempre fui cético quanto a produtos capilares, pois já havia testado vários e sem um resultado satisfatório. Até que em mais uma tentativa eu achei o Happy Hair, onde realmente funcionou. Acho importante deixar e recomendar um produtor que realmente tive resultado. Vou deixar o link para quem quiser:
bit.ly /cabelosemprefeliz

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